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Faustão X Gugu: uma guerra antiga

Não é de hoje que Gugu Liberato e Fausto Silva travam uma guerra pela audiência dominical.

Por: Jonathan Pereira

Não é de hoje que Gugu Liberato e Fausto Silva travam uma guerra pela audiência dominical. Se durante a semana a Globo reina soberana, é neste dia que o público parece encontrar o controle remoto e ver o que os outros canais estão passando. Quem é mais novo e o vê hoje na Record deve estar se perguntando: ‘como assim?’ Mas nos anos 90 e começo dos 2000, quando comandava o “Domingo Legal” no SBT, Gugu era uma verdadeira pedra no sapato da concorrência.

De 1993 a 1996 os apresentadores praticamente não se enfrentaram. Do meio-dia às 16h, o “Domingo Legal” derrotava com facilidade os “blockbusters” da “Temperatura Máxima” – “Ghost, do Outro Lado da Vida”, um dos maiores sucessos do cinema até então, era frequentemente recrutado para a sessão, em vão – as séries americanas e os programas criados às pressas para deter o ibope do SBT (caso do “Ponto a Ponto”, uma espécie de “Passa ou Repassa” disfarçado que foi apresentado por Márcio Garcia, Ana Furtado e Danielle Winits por poucos meses).

Faustão entrava no ar das 15h30 às 19h – e, com o fim de “Os Trapalhões, até as 20h - recuperava o placar quando concorria com os programas do Baú da Felicidade, sob o comando de Silvio Santos. Ao longo desses anos os quadros do “Domingo Legal”, como o “Táxi do Gugu”, no qual ele se disfarçava de taxista, “Gugu na Minha Casa” (cujo auge foi visitar a mansão de Xuxa, em 1995) e a “Banheira do Gugu”, em que homens e mulheres de roupas de banho se agarravam para impedir que o sexo oposto pegasse o maior número de sabonetes, foram se tornando um hábito para o público.

Silvio Santos, que liderava os domingos até a ida de Faustão para a Globo, em 1989, soube ter paciência para consolidar Gugu. Liderar do meio-dia às 16h se tornou pouco para ele e a emissora. Chegara a hora de mudar de horário e colocar o “Domingo Legal” frente a frente com o “Domingão do Faustão”. Entrando no ar mais tarde, a atração poderia derrotar o principal programa da adversária – como o próprio Silvio fazia ao vencer o “Fantástico” e o “Domingo Maior” com o “Topa Tudo por Dinheiro” - e faturar ainda mais com anunciantes. Em outubro de 1997 o grande embate aconteceu.

Gugu passou a derrotar praticamente toda semana o “Domingão”. Nos dias seguintes, o SBT passava um comercial com os números do Ibope e Gugu nocauteando Faustão . Pouco mais de um ano antes, em setembro de 1996, o apresentador global já tinha pisado na bola apelando para bizarrices que só seriam vistas anos mais tarde no “Ratinho Livre”, da Record.



A produção do “Domingão” colocou Rafael Pereira dos Santos, de apenas 87 cm de altura, vestido como o cantor Latino, que se apresentava no palco. Aos 15 anos o “Latininho”, como foi apelidado pelo apresentador, sofria da síndrome de Seckel, que provoca nanismo. Em pouco mais de meia hora no palco ele levantou a audiência, mas causou constrangimento. Mesmo assim, não foi suficiente para um novo tropeço, em 1997.

Em plena tarde, Faustão serviu um cardápio indigesto: colocou Oscar Magrini, Márcio Garcia e Matheus Rocha para experimentar comida japonesa servida em cima de mulheres nuas. O episódio, no qual seios de algumas das modelos utilizadas como “bandejas” apareciam, ficou conhecido como “sushi erótico” e também repercutiu negativamente para o programa.



Gugu também não se fazia de santo e explorava o mundo-cão mostrando, por exemplo, um homem com o corpo e rosto totalmente coberto de pelos. Em 2000, ele leiloou ao vivo uma sunga que Thiago Lacerda teria usado. O ator não gostou e entrou com um processo. A “Banheira do Gugu” também foi reclassificada após reclamações de quase nudez, e só poderia ser exibida após as 21h. Conforme o programa foi sendo esticado para brigar também com o “Fantástico”, chegando a terminar às 22h, o quadro foi reincorporado, mas logo extinto.

Em determinado momento, o programa colocava uma versão animada do apresentador no canto da tela, sempre que estava na liderança. O telespectador que recebesse um telefonema no final da atração ou no domingo seguinte e acertasse quantas vezes o bonequinho apareceu na tela ganhava prêmios. O Ibope proibiu a prática, pois isso era uma forma de obter mais audiência usando seus números de medição.

Em 2001, Jean Claude Van Damme passou por uma situação constrangedora ao ficar excitado ao vivo no palco. Ele não resistiu ao ver Gretchen rebolando e se roçando em seu corpo.



A boa fase do SBT fez com que intervenções acontecessem no “Domingão”, na maioria das vezes sem sucesso. Teve-se a ideia de se fazer mais vezes o programa em São Paulo, já que o concorrente era apresentado na capital paulista. Gravado também não deu certo. Chegou-se até a proibir que cantores que fossem ao “Domingo Legal” se apresentassem nas outras semanas no Faustão. Medida de desespero para forçar as gravadoras a não deixar seus artistas irem ao novo líder de audiência.

Vendo que Gugu conseguia bons índices com um helicóptero que trazia notícias de rebeliões – as dos menores da Febem eram constantes no fim da década de 90 - e acidentes de trânsito, passou-se a direção do Faustão para a Central Globo de Jornalismo, em 2001. Só piorou. Além de quadros sofríveis, ficou ainda mais chato. Não adiantava, era o momento de Gugu, seu programa era quase imperdível entre quem se arriscava a ligar a TV no domingo.

Em 2002 Fausto Silva começou a recuperar aos poucos os telespectadores e um empate entre as duas atrações foi registrado na média do ano. O “Domingão” teve inúmeros quadros, que não vou listar aqui para que nossa conversa não fique longa demais, deixemos para 2014, quando Faustão faz 25 anos no ar na Globo.

O “Domingo Legal” perde a credibilidade em setembro de 2003 ao exibir uma matéria com dois membros da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) em um ônibus, fazendo ameaças a Marcelo Rezende, José Luiz Datena e Oscar Roberto de Godoi, que apresentavam programas policiais nos finais de tarde. A dupla, identificada apenas como Alfa e Beta, ainda se dizia responsável por tentar sequestrar o Padre Marcello Rossi. Acontece que era tudo uma farsa, eles não pertenciam ao grupo! Os telespectadores se sentiram traídos e perderam a confiança e o interesse na atração, que por determinação da Justiça não foi ao ar duas semanas depois, no dia 21 de setembro.

Como não tem nada que o dinheiro não compre, pouco antes disso, em fevereiro de 2003, Gugu e Faustão apareceram ao vivo interagindo, cada um de seu programa, em uma promoção da Nestlé. “Ao contrário do que muita gente até gostaria, nós somos concorrentes, jamais fomos inimigos, muito pelo contrário”, esclareceu Fausto Silva. Eles conversaram por pouco mais de três minutos em uma cena inimaginável até então.



De 2004 em diante a audiência foi voltando com mais facilidade ao “Domingão”, e as vantagens do “Domingo Legal” ficaram mais raras. Isso fez com que Silvio Santos reduzisse os custos de produção.  A transmissão do futebol no domingo às 16h também foi um duro golpe, pois atingiu a primeira parte do programa.

Cada vez menos ameaçado, Faustão passou a reinar novamente, como nos tempos áureos. Em 2009, outra cena inimaginável aconteceu: Gugu trocou o SBT pela Record, que já havia tentado contratar Fausto Silva. Inicialmente ambos não disputavam mais o Ibope, pois o “Programa do Gugu” ia ao ar das 20h a 0h. Após um tempo o horário foi trocado para 16h às 20h, com a alegação de que o público dele “acorda cedo para trabalhar na segunda-feira”.

Embora dê números pífios e dispute com Eliana a segunda colocação, o “cachorro morto” ressuscitou em março de 2013 quando, por duas semanas consecutivas, conseguiu bater o “Domingão do Faustão”. A arma para a façanha? A velha exploração da desgraça, com o anão Marquinhos, do programa “Balanço Geral”, ganhando uma casa e até se casando com uma anã.  Foi só fogo de palha ou Gugu tem fôlego para nocautear o concorrente de novo como fazia na segunda metade dos anos 90 e no começo dos 2000? Vai usar que munição para isso? O “Domingão” vai descer o nível novamente para encarar essa disputa? Tema de uma coluna nos próximos 15 anos.


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