Antônio Calmon está, literalmente, na praia dele. O autor, que se consagrou com sucessos como Top Model e o seriado Armação Ilimitada, volta a abordar o surfe no horário das 19 horas em Três Irmãs, que estréia no próximo dia 15. Mas, desta vez, com a infra-estrutura que sempre desejou. "Tive uma guerra na Globo, mas consegui uma equipe exclusiva especialmente para filmar as cenas de praia", comemora. Pessimista assumido, Calmon deixa claro que não pensa em Ibope e faz questão de não ficar com um medidor de audiência para acompanhar os resultados. "Espero sempre o pior. Assim é mais fácil receber surpresas agradáveis", explica, sempre com bom humor. A novela, com temática feminina, conta a história de três irmãs que fazem de tudo para encontrar a felicidade. Dora, a mais velha, vivida por Cláudia Abreu, é viúva e tenta voltar à vida social, apesar da pressão da sogra Violeta, Vera Holtz, que inferniza a vida dela. Alma, de Giovanna Antonelli, é uma médica bem sucedida que não tem sorte com os homens. E Suzana, de Carolina Dieckmann, é uma surfista dividida entre viver uma paixão ou manter um relacionamento estável com o homem que salvou sua vida. "Me preocupo com as mulheres porque o público ainda é maciçamente feminino", justifica.
Qual é o tema central de ‘Três Irmãs’?
Antonio Calmon:“Três Irmãs” é uma comédia romântica que tem dois vértices. De um lado, ela obedece aos padrões tradicionais de novela. Tem um tema basicamente feminino e, por outro lado, tem o surfe, uma temática que eu gosto de abordar. Eu quero atrair dois públicos: as donas-de-casa e a garotada. Para isso, localizei essa família de mulheres numa cidade que é um point de surfe e misturei a vida delas com a desses surfistas. No mais, é uma novela basicamente cômica, com elementos de melodrama que são necessários para fazer a trama andar. Até os vilões são engraçadíssimos.
Onde busca referências para criar seus personagens, suas histórias?
Antonio Calmon: Cada vez mais eu pego referências em minha própria biografia, fatos pessoais. Cada autor tem um estilo, sua praia. A partir de uma certa idade, você começa a se inspirar na sua própria vida. Eu me inspirei nos meus avós para criar a Virgínia e o Augusto, inclusive os nomes. A minha avó Virgínia era uma mulher simples, do interior do Espírito Santo, que se tornou pastora da igreja Batista e formou oito filhos. Meu avô Augusto era um boêmio, fazia filhos e sumia. Era adorável, irresistível. Eu quis colocar a história dessa mulher, que formou e criou sozinha as filhas, e destacar a união entre elas.
Por que abordar o universo da praia novamente?
Antonio Calmon: O ponto de partida da novela foi complicado. Pedi licença na Globo para produzir o spin-off de "O beijo do vampiro" para o cinema, mas isso não aconteceu. Daí pensei que voltaria ao ar às 18h. Como as novelas do horário são de época, puxei a trama para os anos 60. Só que acharam que a história tinha cara das 19h e a praia entrou como complemento. Acabou sendo uma trama atual.
O surfe será apenas um complemento da trama?
Antonio Calmon: O surfe é uma maneira de atrair o público jovem. O esporte se tornou cada vez mais rentável, movimenta altas cifras e consegui aprovação para a novela com esse tema dentro da emissora.
Foi difícil escalar o elenco?
Antonio Calmon: O casting está difícil na Globo. São três novelas no ar, duas em produção e tem os seriados. E existem atores que acham que fazer cinema é mais nobre: pagam micos horrorosos achando que é melhor estar num filme do que na TV.
Mas você conseguiu os atores que queria?
Antonio Calmon: As irmãs mudaram de idade por causa das atrizes que chamamos. O elenco começou a ficar importante com a entrada da Claudia Abreu. Depois dela, tivemos outras adesões de peso.
Precisou fazer muitas mudanças por causa da escalação?
Antonio Calmon: Ana Rosa ficou com o papel de Virgínia, depois que a Nívea Maria não quis fazer. E Regina Duarte pediu para trocar de personagem. Regina veio de São Paulo, sentou na minha frente e disse que queria fazer a empregada. Começou a dar sugestões e a Mary Poppins (babá do musical americano homônimo) foi uma inspiração. Depois entendi o que ela estava propondo: desde a Porcina que ela não faz um papel tão popular.
Foi uma aposta chamar o Rodrigo Hilbert e o Paulo Vilhena para papéis centrais na novela?
Antonio Calmon: Vi o Hilbert em "Duas caras" e tenho a certeza de que ele vai estourar já, já. Escrevi um papel na medida para ele. Já o Paulinho no elenco é um luxo. Foi amor à primeira vista. Ele tinha tudo para ser mais um jovem ator bobalhão da Globo. Primeiro foi bad boy, mas depois recuou. Rodrigo vai explodir e o Paulinho está no ponto há muito tempo. .
Em quem mais você aposta?
Antonio Calmon: Em todos do elenco principal. Dentre os novos tem a Daniela Récco, que vai ser a Duda. Ela se disfarça de Carlinhos para fugir do padrasto e depois se passa por Laila, irmã gêmea do Carlinhos. Tinha que ser uma cara nova.
Quais são os principais atrativos da trama?
Antonio Calmon: Quero divertir as pessoas, e eu mesmo dou risada com as piadas da novela. Também choro com cenas, como as da Ana Rosa, que é a mãe das protagonistas. Quis homenagear minha avó paterna, Virgínia, com essa personagem. Já cansei de ficar com os olhos cheios d'água escrevendo as cenas dela. Quero mostrar nesta cidadezinha da novela, que é uma espécie de representação do Brasil, coisas curiosas e engraçadas do nosso comportamento.
A audiência das 19h, hoje na casa dos 30 pontos, preocupa?
Antonio Calmon: Fui cobrado por dar só 35 pontos com "O beijo do vampiro" (de 2002), mas os tempos mudaram e hoje concorremos com outros veículos. O universo do público televisivo diminuiu, embora esta novela possa ser um evento em si pelo tema.
Mas existe uma pressão para voltar a dar mais de 30 pontos no horário?
Antonio Calmon: Procuro entrar com um foco de ambição lá em cima. E estou vindo com minhas armas. Tenho um elenco de novela das 21h, os meus personagens surfistas, uma câmera especial só para as cenas do esporte. Já tenho mais de 40 capítulos escritos e quero estrear com 48.
Você sempre escreveu novelas das 19h. Qual a maior dificuldade deste horário?
Antonio Calmon: Cada horário de novela tem suas características, suas peculiaridades, suas dificuldades. E cada autor tem uma praia. A minha é essa: o horário das 19h. Uma das diferenças deste horário em relação aos demais é o público, que é muito diversificado. As pessoas estão chegando, saindo, preparando jantar. É muito difícil captar a atenção delas. Por outro lado, o horário das 19h me permite brincar com a imaginação. Você tem muito mais liberdade, pode ser mais leve e brincar com a história.
Outros autores dizem que é difícil escrever para às 19h porque o público é variado. Concorda?
Antonio Calmon: Gosto de escrever para o horário. Novela das 19h tem que ter humor e tenho vilões hilários. Mas sei que só isso não faz a trama andar.
Tem vontade de escrever novela das 21h?
Antonio Calmon: Para escrever novela das 21h você tem que ser sério e eu não consigo ser sério por mais de cinco minutos.
O personagem Augusto, interpretado pelo José Wilker, tem um pouco do realismo fantástico do Dias Gomes?
Antonio Calmon: Essa novela é uma homenagem ao Dias Gomes, que sempre foi absolutamente gentil e correto comigo. Eu adoro as coisas que ele fez. Dias Gomes é indiscutivelmente o autor do maior sucesso da televisão brasileira, ‘Roque Santeiro’. Estou revisitando esse universo, através da cidadezinha, das coisas meio mágicas, meio estranhas, que acontecem nela. No meio da novela, Augusto chega à cidade com outro nome e fica a dúvida sobre quem ele realmente é: se é o Augusto, um sósia, uma figura negativa. Como aconteceu em ‘Roque Santeiro’. O Glauco, personagem do Guilherme Piva, por exemplo, é dono de uma funerária que está indo à falência, porque ninguém morre na cidade. Toda vez que alguém está doente, ele fica na porta que nem um urubu, para ver se a pessoa morre.
Você fala muito da luta do bem contra o mal. Como ela será mostrada em ‘Três Irmãs’?
Antonio Calmon:A luta entre o bem e o mal é inevitável, é um elemento das novelas. Em ‘Três Irmãs’, eu transformei essa luta do bem contra o mal numa luta pela ecologia, encabeçada pelos surfistas Zig (Brenno Leone) e Thor (Caio Vaz). Vamos focar muito na defesa da praia que os vilões querem não só tomar da população e ocupar, como também fazer uma grande negociata com o dinheiro público.
Logo no primeiro capítulo, a personagem Natalia (Cecília Dassi) fica grávida. Alma (Giovanna Antonelli) é uma ginecologista que trabalha no ambulatório de Caramirim. Como você vai abordar questões como gravidez na adolescência e saúde da mulher?
Antonio Calmon: Eu não me programo sobre os temas que vou abordar. As tramas saem naturalmente, porque eu me informo, leio jornal, livro, vejo televisão. Na história, Natalia tem 17 anos. No mundo real, tem casos de gravidez muito mais cedo do que eu estou mostrando. Outra questão que surgiu com naturalidade foi a da saúde da mulher. Como eu tenho uma experiência prévia do seriado ‘Mulher’ e a personagem da Giovanna será uma ginecologista, vamos falar sobre o problema seríssimo de HPV e do câncer de mama. As pessoas na cidade de ‘Três irmãs’ têm vergonha de fazer o exame, porque o único médico da cidade é homem. A Alma vai tentar vencer essa resistência.
Como é sua relação com o elenco?
Antonio Calmon: Gosto de me reunir com os atores antes da novela começar. Chamo de vestir o personagem para o ator. Ou seja, chamo a atriz e quero ver como ela está ou conhecê-la, se for o caso. Eu quero ouvir a sua voz para saber como escrever os diálogos. Quero saber o que ela está achando do personagem, o que gosta mais, o que gosta menos, se tem alguma idéia. Cada encontro me dá umas cinco idéias de trama e me enriquece muito. Eu adoro ator inventivo. Eles já chegam cheios de idéias. A Dora tinha um tom mais pesado, mas a Cacau (Claudia Abreu) me convenceu a mudá-la. Chegou cheia de idéias e, inclusive, com uma sugestão de trilha sonora para a personagem. Acho isso comovente e incorporo à trama. A Regina Duarte, por exemplo, mudou o personagem dela e nós topamos porque ficou muito divertido. Este será o primeiro personagem, desde a Viúva Porcina, que sai do “padrão Regina Duarte”. Ela vem a mil por aí, cheia de gás. É um personagem que estamos fazendo juntos, em um trabalho coletivo.
Como é a escolha da trilha sonora?
Antonio Calmon:Eu participo muito da trilha sonora da novela. Tenho reuniões para decidir o tema de abertura, as trilhas incidentais. Haverá uma novidade: pela primeira vez, os dois discos serão mistos: nacional e internacional. E já adianto: a trilha de ‘Três Irmãs’ será bem diversificada.
Três Irmãs
Quando: estréia nesta segunda, às 19h
Onde: na Globo
Classificação indicativa: livre