O apresentador do CA no RJ conta as dificuldades e alegria de fazer um telejornal em uma das cidades mais violentas do Brasil.
Por: Emerson Ghaspar - Contato: [email protected]
A audiência crescente do Cidade Alerta Rio, que é vice líder no horário em quase todos os dias em que é exibido, chegando a dar 14 pontos no ibope, comprovam o carisma e credibilidade que Ernani Alves junto ao seu público.
Pai da pequena Laura, Ernani é um daqueles profissionais que costumam chegar cedo a redação do jornalístico para acompanhar de perto tudo o que está sendo feito. Tudo em razão de levar um conteúdo honesto e imparcial para os telespectadores locais. Em entrevista exclusiva, Ernani nos conta um pouco mais de sua rotina e de seus momento de lazer.
Qual é a parte mais divertida (se há) e a parte mais triste em conduzir um telejornal que atinge tantas pessoas?
Ernani: A parte mais divertida é encontrar o público na rua, no shopping, na praia... porque quando as pessoas param pra conversar elas querem opinar também sobre algo que eu tenha dito no programa, querem completar com algum comentário, querem poder concordar ou discordar, enfim, as pessoas querem participar. Isso mostra uma tendência que a comunicação vai ter que seguir daqui pra frente, que é a tendência cada vez mais da interatividade, através das redes sociais, através da própria TV, com telefone, com e-mail, é o que fazemos já no programa. Na rua já se sente que essa interatividade se faz necessária porque as pessoas querem cada vez mais participar.
O lado mais triste de fazer um programa assim é perceber dia após dia como a natureza humana é capaz de fazer coisas tão terríveis contra seu semelhante. A gente não vê no mundo animal as barbáries que a gente vê no humano. No mundo animal. A gente vê brigas entre machos que podem disputar um terreno, mas a humanidade é capaz de fazer coisas tão perversas que a gente fica as vezes sem acreditar que aquilo é possível. Por incrível que pareça fazendo jornalismo policial a 20 anos eu ainda me deparo com coisas diferentes, inusitadas e que geralmente pro lado bárbaro. Essa é a parte mais triste, perceber que a gente as vezes parece estar na Idade Média.
O Cidade Alerta é considerado por muitos um telejornal sensacionalista que abusa de tragédias para conseguir audiência. Como você encara isso? Como você sabe até que ponto ir para alcançar o telespectador e não chocá-lo?
Ernani: Não. Eu não classifico o programa que eu apresento como sensacionalista de modo algum. Talvez na origem, sim, os programas policiais tenham tido essa conotação sensacionalista, no entanto é algo superado por boa parte deles. Eu incluo o Cidade Alerta nessa parte que não pratica esse tipo de jornalismo. O que a gente faz hoje na verdade é prestar um grande serviço pro morador do Rio de Janeiro. Imagine só, tem um tiroteio na Grajau – Jacarepaguá, 6 horas da tarde eu estou no ar e informo. Tem um tiroteio na linha amarela, tem uma guerra de traficantes aqui, ali... A gente vai informando e as pessoas vão traçando rotas se tiverem no transito para fugirem disso. E se forem moradores daquela área vão ficar dentro de casa, se tiverem na rua darão um tempinho até que eu informe que tudo está normalizado pra poder voltar. Isso é prestação de serviço.
Hoje o Cidade Alerta pra mim é isso. A gente mostra a polícia numa cidade extremamente violenta e dessa forma a gente presta um serviço ao morador dizendo “evite essa área”, “agora tá acontecendo isso, agora aquilo” e também quando mostramos matérias que apresentam problemas de algum bairro, a gente alerta sobre os perigos. As pessoas vão se prevenindo, vão se orientando, através das informações. Isso não tem nada de sensacionalismo.
Em 2011, seu colega e cinegrafista Gelson Domingos foi baleado e morto por traficantes da comunidade de Antares, em Santa Cruz, na zona oeste do Rio. Como é seguir adiante com uma tragédia como essa?
Ernani: Foi de fato muito marcante, muito chocante, na minha carreira. O Gelson era um cinegrafista altamente qualificado, buscava sempre as melhores imagens e eu e ele respeitávamos o limite um do outro. Então naquele dia eu estava em uma posição e Gelson em outra. Ele quando se posicionou para fazer o flagrante de bandidos que atiravam na direção da polícia, creio eu que ele achava que a polícia fosse levar vantagem e assim ele teria a melhor imagem. Como a gente sempre fazia, voltávamos das comunidades, depois de uma operação policial com as melhores imagens do Gelson e minha matéria fica magnifica. Infelizmente naquele dia não aconteceu isso.
Esse fato marcou minha vida, realmente me deixou chocado. Por alguns meses eu tive dificuldade em voltar a fazer matérias policiais, mas a gente tem que superar né? A vida continua, tenho muito respeito pela família dele. A filha dele inclusive é estudante de jornalismo, já a orientei nessa profissão algumas vezes. A gente vai tentando tocar a vida, lembrando com carinho desse grande companheiro.
Como você superou esse momento tão dificil?
Ernani: Depois dessa ocorrência com o Gelson, muita gente falou pra largar isso e quando voltei a fazer matérias policiais arriscadas, fui muito criticado e tal. A explicação para ter voltado a fazer foi simples: 20 anos acompanhando polícia, fazendo matérias policiais, a minha preocupação sempre foi o morador. Abandonar isso, é virar as costas pra praticamente metade da população do Rio. Uma população que vive em zonas de guerra, zonas de conflito, uma população que quando não está à mercê do tráfico, está nas mãos de milícias. Seguir em frente, nessa atividade de jornalismo policial. É seguir em frente na busca pela proteção dessas pessoas. Pessoas de bem, que trabalham o dia inteiro, que não tem condições de ter uma casa em um lugar melhor, não tem condições de ter benefícios mínimos. São pessoas que simplesmente estão na mão do crime.
Não acompanhar essas operações é deixar pra trás essa gente e essa gente eu não consigo deixar pra trás. Adoro pessoas mais simples, humildes. Nasci no acesso ao Morro da Serrinha em Madureira, onde dei meus primeiros passos. Essa gente é a minha gente. Não podia virar as costas e não fazer o trabalho da imprensa que é fiscalizar. Faço questão de mostrar a boa polícia, é a polícia que eu quero mostrar sempre. Não podemos negar que há excessos, que há problemas. Se a imprensa e outros órgãos fiscalizadores virarem as costas pra isso, vamos permitir que os problemas se tornem maiores. O papel do jornalismo é esse: ser humano, é ser fiscalizador é sempre estar do lado do mais fraco.
Houve alguma matéria em que você pensou em não exibir por algum motivo?
Ernani: Matéria eu nunca deixei de exibir, mas já deixei de mostrar trechos da matéria. Trechos que poderiam dar problemas para quem estava dando a entrevista. Porque as vezes, a pessoa que vive em área dominadas por bandidos, ela acha que só ocultando a face, a gente tem esse recurso na TV, bota uma sombra, embaçado e tal. A pessoa faz uma denúncia, só que as vezes a denúncia é tão especifica, que o bandido vai saber quem está falando. Em alguns momentos pra preservar a vida, de quem tá denunciando, no caso a fonte, eu de fato preferi não exibir o trecho em que a pessoa poderia se comprometer e preferi passar as informações por minha própria boca.
A única coisa que me leva a deixar de exibir algo é a preservação da vida, da pessoa que está denunciando, da fonte. Do contrário, noticia é notícia, não importa quem está envolvido, ela tem que ir pro ar. Esse é o jornalismo que prego, o jornalismo sério e até brinco; “Se alguém da minha família for preso, estiver fazendo alguma coisa de errado, pode fazer a matéria, põe no ar”. Comigo é assim, não tenho a menor preocupação quando o assunto é notícia porque eu procuro fazer tudo na minha vida o mais certinho possível, porque senão a gente não tem moral de falar nada.
Qual é a matéria que mais te emocionou ou te deixou mais orgulhoso em fazer?
Ernani: Orgulhoso com uma matéria? Não sei se seria bem essa palavra, mas há uma ocasião que me deixou feliz. Em 2010 quando houve a invasão do Complexo do Alemão, fui escalado para acompanhar os primeiros passos da polícia lá. Passei a noite de sábado pra domingo, eles iam entrar num domingo cedo, assim que clareasse. Só que quando eu me dei conta, começaram a cercar com grades, de tal maneira que a imprensa não conseguia se aproximar. De repente eu percebi que tinha um privilégio de determinada emissora, era a única atrás da grade para acompanhar a polícia.
Sentei no meio fio e pensei “não é possível”. Enfim, coisa da política, nem da polícia, coisa da política na época né. Ai, nisso, sentado, reclamando, tem um policial ouvindo, um policial civil que eu nunca vi na vida e nem voltei a ver. De repente ele chega e diz que é amigo do meu pai a mais de 30 anos e que é pra mim entrar com meu cinegrafista dentro do carro dele e que ele vai me colocar junto com a outra equipe de outra emissora que vai cobrir a ação.
Dito e feito. A cara dos coleguinhas da concorrente que tinham feito alguma manipulação política. Não eles coitados, mas alguém por cima deles. A cara foi a melhor do mundo. Quer dizer, nessa profissão a gente tem que ter um pouquinho de sorte também. Fiquei orgulhoso, pelo meu pai, que tinha muitos amigos e um amigo dele ali ajudou e tal. Até hoje não sei quem é essa pessoa. Foi um anjo que caiu ali e me ajudou a ficar igual. A ter uma concorrência leal, mas na minha vida sempre aconteceu isso.
Toda vez que tentaram agir de maneira desleal, sorrateira, alguma coisa se movimentou e eu pude competir de igual pra igual. Aliás, tem que ser assim. É o que a gente espera do Brasil. Que as pessoas tenham oportunidades iguais pra se valerem do talento e não do esquema. Tenho nojo de esquema.
Críticas evidentemente afetam a quem está na mídia. Como você lida com elas?
Ernani: Sou adepto de uma ideologia simples: Só me preocupo com o que eu penso de mim. Quando eu vejo, uma gravação do programa e analiso item por item e identifico que determinado item poderia ficar melhor, de repente uma entonação de algo que tenha dito, um comentário poderia ter ficado melhor. Quando eu tiro a minha conclusão com base nos meus 20 anos de carreira, vou lá e corrijo. Busco sempre fazer o melhor, só vale isso.
Agora se outros criticam por criticar, porque são essas a maioria das críticas que a gente vê por ai, não tem sentido a gente dar ouvido. Se a gente for se preocupar com o que os outros dizem a gente não abre a boca em um programa na televisão. Não tem como agradar todo mundo. Até quem não gosta da gente fica assistindo pra torcer contra. É uma minoria, não fico preocupado com isso.
Você é pai. Há diferenças entre o Ernani pai, marido e apresentador de telejornal?
Ernani: Olha, a televisão de antigamente permitia mais personagens, ou seja, o sujeito podia ser um na televisão e ser outro fora dela. Hoje em dia quem tá nessa corre um sério risco de ser desmascarado porque com as redes sociais ou você é o que é ou você vai frustrar seu público. Sou um sujeito que anda na rua, que fala com todo mundo e tal, eu sou na televisão exatamente o que eu sou como pai, como filho, como amigo, como qualquer coisa.
Eu sou a mesma pessoa. Sabe porquê? Porque as pessoas vem falar com a gente na rua e elas esperam o mesmo Ernani. Não tem como querer ser um personagem. Tô ali no programa e falo o que penso. Sou exatamente quem eu sou. Se não for assim não funciona e isso tem dado certo, graças a Deus. As pessoas reconhecem essa verdade. Quando você não passa verdade você tem uma grande chance de fracassar naquilo que você faz. Isso não é só em televisão, é em tudo. E a melhor maneira de passar a verdade é ser você.
O que faz nas horas vagas?
Ernani: Andei muito tempo sem ter horas vagas. Tava trabalhando direto. Quando não tava fazendo programa, tava tocando projetos pessoais, enfim, coisas minhas para poder ter uma renda aqui, outra ali e tal. Enfim, projetos, coisas menores que me renderiam algum tipo de lucro. Agora de uns tempos pra cá, eu tô diminuindo isso pra poder voltar a ter horas vagas porque o que eu mais gosto é de viajar. Já tô planejando uma viagem para minhas férias, que serão em janeiro. Já estou adiantando que do dia 1° até o dia 20 estarei de férias. Ai vou viajar, porque é o que mais gosto de fazer. Eu gosto de conhecer pessoas, de todo tipo, de toda natureza. Esse mundo é enorme, tem tanta gente diferente, gente interessante e quanto mais a gente conhece as realidades, a gente vai tendo condições de entender melhor as pessoas e conseguir se comunicar melhor com todas elas. Gosto de conhecer o mundo.
Muitos vêem em você um forte candidato a apresentar o Cidade Alerta para todo Brasil. Você almeja isso?
Ernani: Fico feliz pelas pessoas que me acompanham no Rio de Janeiro me enxergarem como alguém que tem condições de apresentar um programa para todo Brasil. Ótimo. Agora, sinceramente, não almejo no momento apresentar o Cidade Alerta nacional porque tenho lá um grande amigo, um grande companheiro que é o Luiz Bacci, que tá muito bem, tem dado bastante audiência e tudo indica que vai ficar ali um bom tempo porque é sucesso. Graças a Deus e que Deus o continue abençoando. Agora se pintar um projeto nacional, tô dentro também, depende do que a empresa queira pra mim. Se for do interesse a gente parte pra lá.
Deixe um recado para o seu público.
Ernani: Pra quem acompanha o Cidade Alerta Rio, eu só tenho que agradecer. Tenho muita gratidão, muita gratidão mesmo pelo público do Rio de Janeiro que cada dia que passa está acompanhando mais e mais o programa. Tenho a impressão que é o seguinte: o sujeito acompanha o programa, ai ele conta pro irmão, pra tia, pra mãe pra avó... Por isso que devagarinho, nos últimos dois anos, cada mês que passa nós vamos subindo em audiência. Por isso eu só tenho que agradecer ao povo do Rio de Janeiro.
Ernani Alves apresenta o Cidade Alerta Rio que é exibido na Record TV de segunda a sábado as 18h.