Antra destaca equívocos nas definições de Ivana e Nonato.
Lenta e delicadamente tratado por Gloria Perez desde o primeiro capítulo de A Força do Querer, o drama de Ivana (Carol Duarte) vem avançando no sentido de sua transição física. Embora esteja amparada por importantes nomes do movimento LGBT, como João W.Nery e Jane Di Castro, a autora já tem uma manifestação oficial contrária a alguns aspectos de sua abordagem da transgeneridade.
A Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) publicou em sua página no Facebook uma nota destinada à Glória, em que aponta equívocos na condução do tema. Depois de admitir que a trama da Globo "tem prestado um relevante serviço quando aborda a questão da transmasculinidade vivida pela personagem Ivan/Ivana", a ONG contesta a utilização do termo transgênero para definir a filha de Joyce (Maria Fernanda Cândido). Conforme esclareceu OPTV por ocasião da estreia da novela, transgênero é um termo guarda-chuva que abarca todas as nomenclaturas (transexual, travesti, drag queen...). "No nosso entendimento, a personagem é um homem trans, inspirada na obra do escritor, homem trans, João W. Nery. Agora, quando se refere às Travestis, a novela se perde numa profusão de diálogos e conceitos que não ajudam em nada essa população, e acaba complicando ainda mais o trabalho que temos desenvolvido ao longo de anos, que é o de tirar o estigma que esse termo representa", diz a nota da Antra.
A pesquisadora Sayonara Nogueira, secretária de comunicação da Rede Trans Brasil, outra importante instituição de defesa dos direitos dessas pessoas, também destaca o teor pejorativo carregado pelo termo: "Travesti, para mim, é uma bandeira política; e é um termo muito usado, sobretudo, no Brasil. O termo transexual acho muito higienizado, é como se a transexual fosse a limpinha, branca, passável, que se inseriu no mercado de trabalho; e a travesti é a suja que está se prostituindo na rua. Gosto do termo transgênero como um termo guarda-chuva que abarca todas essas nomenclaturas. Se eu fosse jornalista e escrevesse uma matéria, citaria o termo transgênero". De acordo com este entendimento, Glória deveria tratar Ivana e Elis/Nonato (Silvero Pereira) como transgêneros, e não diferenciá-los. "Travesti não representa uma coisa que ela não seja, ela não é um falsete como a novela mostra nalguns diálogos, especialmente quando é associada com a identidade gay, o que também não é correto, pois gay é uma identidade masculina”, continua a nota da Antra, deixando implícito outro esclarecimento importante: lésbica é o termo adequado para definir mulheres que se sentem atraídas por outras mulheres.
Já confusão em torno de Elis Miranda, pode ter surgido em razão da personagem adotar identidade masculina durante o dia para sobreviver financeiramente. A nota da Antra esclarece que uma travesti "vive 24 horas no gênero feminino", diferente de um transformista, que apenas usa os símbolos relacionados ao universo feminino para apresentações artísticas. Em uma cena específica, Elis disse que não pretende mudar nada em seu corpo por se identificar como travesti, mas é comum que essas pessoas coloquem próteses de silicone e usem hormônios, assim como as transexuais costumam fazer. No entanto, não são as modificações corporais que definem uma pessoa como trans, e sim a forma como elas se sentem, independentemente de terem passado por uma transição física. "Esperamos assim contribuir e nos colocarmos à disposição para dialogar mais e aproveitar sobremaneira a oportunidade trazida pela autora, mas vimos através da nota expor não um incômodo pessoal, mas de inúmeras travestis por esta entidade nacional representadas Brasil afora!", encerra a nota, assinada pela presidente da Antra, Keila Simpson.
Aqui você pode conferir as definições dos principais termos e entender mais a vulnerabilidade das pessoas trans na sociedade.