A despedida de Raul Gil levanta questões sobre o valor da experiência no mercado de trabalho 60+.
A recente demissão de Raul Gil, aos 86 anos, após 14 anos no SBT, traz à tona uma questão crucial no mercado de trabalho brasileiro: os desafios enfrentados por profissionais com mais de 60 anos. Embora a legislação proíba a discriminação etária, a realidade prática do mercado muitas vezes contradiz essa proteção.
Raul Gil, assim como muitos profissionais capacitados e com carreiras consolidadas, enfrenta dificuldades para se manter no mercado de trabalho. Apesar de sua vasta experiência e longa trajetória na televisão, ele não está imune às pressões do mercado, que frequentemente favorece profissionais mais jovens, especialmente nas mídias tradicionais. Esse fenômeno reflete uma tendência mais ampla, onde a experiência dos mais velhos é muitas vezes ofuscada pela busca por inovações rápidas e o apelo por uma audiência mais jovem.
Por outro lado, Marcos Tonin, especialista em RH com 24 anos de experiência, destaca que, nos últimos 12 anos, a participação de pessoas com 60 anos ou mais no mercado de trabalho cresceu significativamente, superando até mesmo o aumento da presença de jovens e adultos. De 2012 a 2024, o número de trabalhadores com mais de 60 anos passou de 3 milhões para cerca de 8 milhões, alcançando um pico histórico no segundo trimestre de 2024, segundo dados do IBGE. Essa mudança não apenas demonstra o aumento quantitativo dessa faixa etária no mercado, mas também evidencia o papel crescente dos profissionais seniores em diversos setores da economia.
Tonin ressalta que, embora o cenário atual possa parecer desafiador para profissionais seniores com mais de 50 anos, o mercado já sinaliza uma valorização crescente desses trabalhadores, impulsionada, em parte, pelas frustrações com a Geração Z. As habilidades de adaptação e perseverança dos mais jovens têm sido questionadas em diversos ambientes de trabalho. “As empresas começaram a perceber que, além da experiência, os profissionais 50+ oferecem estabilidade, ética de trabalho sólida e um compromisso com a qualidade, características que nem sempre estão presentes nas gerações mais novas. Esse movimento está reformulando a forma como as organizações enxergam o valor da experiência”, comenta Tonin.
O especialista também orienta que, para ter sucesso no mercado de trabalho após os 60 anos, é fundamental o autoconhecimento. Isso significa entender claramente suas habilidades, interesses e experiências. Além disso, manter-se constantemente atualizado é essencial. Investir em cursos, workshops e treinamentos alinhados às tendências do mercado e ao mundo digital pode ser decisivo para se manter relevante e competitivo. Para Tonin, o equilíbrio entre a experiência adquirida ao longo dos anos e a disposição para aprender novas tecnologias e metodologias é o caminho para prosperar em um ambiente de trabalho em constante mudança.
Raul Gil exemplifica as diferentes fases da carreira dos profissionais com mais de 60 anos no Brasil, destacando as dificuldades e desafios dessa faixa etária no mercado de trabalho. Nesse sentido, Tonin comenta: “O brasileiro não tem o hábito de planejar passos de carreira, tudo é muito reativo. Muitos profissionais deixam para trabalhar seus currículos, perfis no LinkedIn e acionar seu network apenas quando precisam ou estão em risco. Esse comportamento é perigoso e causa muito estresse. O ideal é entender o momento da carreira, estudar continuamente e acompanhar as mudanças do mercado, da profissão e da digitalização.”
Com o crescimento acelerado da população acima de 60 anos, especialmente considerando que, em 2041, o Brasil atingirá seu pico demográfico de idosos, a necessidade de reintegração desses profissionais ao mercado de trabalho se torna ainda mais relevante. “Raul Gil, portanto, é um exemplo de como, aos poucos, o mercado tem absorvido a experiência e o conhecimento desses profissionais como uma valiosa contribuição para a força de trabalho”, finaliza Tonin.