Bial trocou de lugar com Jô para entrevistá-lo.
Conheci o Jô no início da década de 80. Eu, jovem repórter, fui entrevistá-lo. Ele morava em uma cobertura na Lagoa e estava estreando seu novo programa e ele me recebeu com grande carinho e generosidade. Já, de cara, propôs que eu fizesse a entrevista com ele dentro da piscina. Ele dentro da piscina e, eu, à margem. Naquela época, seria impensável um jovem repórter entrar na piscina com o Jô para entrevistá-lo.
Se bem que, na memória dele, sempre que me encontrava, ele comentava: "Eu me lembro daquela primeira entrevista que a gente fez, com você lá dentro da piscina comigo". E eu falava: "Jô, eu não estava dentro da piscina". Seguiu teimando comigo até eu mostrar a imagem para ele muitos anos depois quando veio ao "Conversa".
Sempre que eu o encontrava era aquela troca muito rica. Ele era uma cabeça eternamente inquieta vendo o absurdo das coisas e traduzindo da forma mais amoroso e humorosa. Ele tinha o dom de nos fazer rir de nós mesmos, o que é um sinal de inteligência. A inteligência dele despertava a inteligência dos outros. Essa era, talvez, uma das chaves de seu sucesso como anfitrião.
Mais que um entrevistador, ele era um anfitrião no programa dele. Lembro que, quando correspondente, ele me chamou e me recebeu no SBT, no programa dele, o "Jô Soares Onze Meia". Eu tinha feito a cobertura dos eventos de 1989 no Leste Europeu e estava lançando um livro com a Renée Castelo Branco. Ele foi, como sempre, muito gentil e divertido.
Anos depois, nos revimos e nos aproximamos bastante quando ele lançou um de seus livros. Era 1996, eu tinha voltado ao Brasil. Fui à casa dele e, desde então, a gente se falava pelo telefone de vez em quando. Ele era um conversador ao telefone, gostava de ligar e ficar dando risada.
O humor dele no particular era um pouco mais ferino do que o humor dele público. Tinha uma língua afiadíssima. O poder do humor de despir as hipocrisias da vida social e, quando tornava esse humor público, dava uma adoçada. Mas, na intimidade, podia ser mais ácido e aí era ainda mais divertido.
Além de deixar toda sua obra como humorista, deixa também sua obra como anfitrião de talk show que só elevava seus convidados e elevava junto seu público, respeitando a inteligência do público, reconhecendo uma inteligência que muitas vezes era subestimada por entendedores de televisão. Ele mostrou que o Brasil estava pronto para um talk show daquele nível de excelência. Muita gente boa achava que não.
Seus livros divertidíssimos e suas peças eram feitas para o outro, para o público. O Jô tinha aquele universo interior maior que a barriga dele, no entanto, se esvaziava para se entregar ao público. Ele fazia sempre questão de ser acessível, de estar próximo, de chegar perto do espectador, do leitor. Essa era uma das grandes graças e genialidades do nosso querido gordo.
Palavras do nosso querido Pedro Bial.