Quando entrou na grade da Globo, em 5 de junho de 1988, o humorístico TV Pirata tinha como finalidade preencher a lacuna deixada por Jô Soares com o fim do seu Viva o Gordo.
Mas, em poucos meses de exibição, o programa caiu nas graças do público e chamou atenção pela forma irreverente e ousada adotada para suas críticas à televisão e à sociedade.
Com uma atuação que pode ser resumida à famosa expressão latina "rindo se corrigem os costumes", Cláudia Raia, Cristina Pereira, Débora Bloch, Diogo Vilela, Guilherme Karam, Louise Cardoso, Luiz Fernando Guimarães, Marco Nanini, Ney Latorraca e Regina Casé se revezavam em esquetes algumas vezes completamente non sense, parodiando a programação das emissoras.
"Era quase uma televisão pirata mesmo, porque a equipe era enorme e tinham vários cenários diferentes. Foi o meu trabalho mais complexo na televisão", lembra Guel Arraes, diretor e principal responsável pelo projeto.
A fórmula do TV Pirata não era tão diferente assim da utilizada pela maior parte de programas de humor atuais: um revezamento de quadros com linguagens, figurinos e cenários distintos.
Mas o principal trunfo da equipe estava no texto, sempre inspirado na realidade brasileira e muito ácido quando se tratava de assuntos políticos ou sociais.
Como a equipe de redação contava com mais de dez pessoas - entre eles Mauro Rasi, Luiz Fernando Veríssimo, Patricya Travassos, Pedro Cardoso e os "cassetas" Hubert, Reinaldo, Bussunda, Cláudio Manoel, Hélio de La Peña, Beto Silva e Marcelo Madureira -, cada quadro ganhava um estilo diferente de interpretação e de direção.
"Aprendemos a tratar cada esquete como uma parte independente. Não enxergávamos como um programa inteiro, até porque eram vários autores e cada um seguia uma linha diferente", explica José Lavigne, que dividiu com Guel a responsabilidade de dirigir quadros até hoje lembrados, como a novelinha Fogo no Rabo, As Presidiárias e o hilário TV Macho, ancorado pelo inesquecível Zeca Bordoada, uma sátira ao canal TV Mulher.
Louise Cardoso, Ney Latorraca e Cristina Pereira são exemplos de artistas que participaram do projeto e que ainda hoje se mostram saudosos ao relembrarem esse período.
"Conseguiram juntar cinco atores e seis atrizes geniais em um programa que virou um marco na tevê", valoriza Ney Latorraca. "Apontávamos defeitos da sociedade de um jeito divertido e inovador", completa Louise, que deixou o humorístico ao fim de seu segundo ano de exibição, assim como Ney e Cláudia Raia.
Para Cristina, um dos motivos que levaram a equipe ao sucesso durante os primeiros dois anos foi o bom relacionamento entre o elenco e a igualdade salarial conquistada depois de alguns meses de exibição. "O Marco Nanini e o Ney insistiram e igualaram o cachê de todos", conta.
Mas, ironicamente, foi também o alto custo e, é claro, o desgaste de algumas idéias já não tão revolucionárias, que condenaram o programa e o tiraram da grade da emissora por dois anos.
Em 1990, o sucesso de audiência de Pantanal e a queda do TV Pirata no Ibope se juntaram à crise econômica motivada pelo plano Collor. Vários anunciantes não investiam mais tanto dinheiro em publicidade e o humorístico ficou fora do ar entre 31 de julho de 1990 e 21 de abril de 1992, quando foi ressuscitado.
Na época, do elenco original, sobraram apenas Débora Bloch, Guilherme Karam e Cláudia Raia, de volta ao humorístico. "Algumas pessoas foram chamadas e não aceitaram, mas nem isso eu fui. Cheguei a ligar para perguntar se eu não seria convidada, mas colocaram a Marisa Orth no meu lugar", lamenta Cristina Pereira.
Na época, a proposta era de um programa mensal, mas já no fim do mesmo ano o projeto foi aposentado.
Até hoje lembrado como um dos marcos da Globo, TV Pirata ganhou um DVD duplo em comemoração aos 40 anos da emissora, no final de 2004.
No ano seguinte, o canal pago Multishow também exibiu a maior parte dos episódios do primeiro ano do humorístico.
Créditos: TV Press