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Salomé: romance e sedução nos anos de 1930

Obra foi uma adaptação do romance de Menotti Del Picchia.

Por: Emerson Ghaspar - Contato: [email protected]

Ambientada em São Paulo da década de 1930, a trama conta a história de Salomé (Patrícia Pillar), uma jovem a frente de seu tempo, que não permite se apaixonar, pois acredita que assim perderá sua liberdade. Rebelde, ousada, provocativa, sensual e ambiciosa, a jovem protagoniza seminua uma dança dos véus, que escandaliza a sociedade parisiense.

A notícia de que Salomé dançou seminua chega ao Brasil e sua mãe, Santa (Imara Reis) pede que seu marido Antunes (Carlos Alberto), padrasto da jovem, a busque em Paris. A senhora teme pela reputação da filha e acredita que em São Paulo a jovem pode ser controlada.

Na cidade luz, Antunes encontra Salomé, mas a jovem se recusa a voltar.  A jovem impõe uma condição para retornar: que seus amigos Berta (Suzy Rêgo) e Ruggero (Mateus Carrieri) possam ir junto. Antunes aceita a imposição da jovem e todos voltam para o Brasil.

Em São Paulo, Salomé e seus amigos vão morar na fazenda Pindorama. No local, a jovem conhece Duda (Petrônio Gontijo), aspirante a cantor e filho do antigo proprietário que se endividou e teve que vender a propriedade para Antunes. Após a venda, o pai do jovem se suicidou. No início da trama, Duda é aspirante a cantor e noivo de Mônica (Mayara Magri), mas mantêm um caso com Santa. No decorrer da trama, Mônica é obrigada a se casar com Mc Gregor (Rubens de Falco) para poder salvar sua família.

Conforme retorna ao convívio de sua família, Salomé percebe que a mãe está aparentemente feliz com sua condição financeira, mas aos poucos percebe que Santa é amarga e rancorosa. A mãe da protagonista vive batendo de frente com Ernestina (Lilia Cabral), uma mulher que vive a espera do marido morto e que é considerada louca. Paralelo a isso, Antunes começa a se interessar pela enteada.

Com seu charme, Salomé começa a despertar o interesse em Duda, que se aproxima da jovem. Não demora muito e Salomé responde aos sentimentos do rapaz, criando assim um triangulo amoroso entre Santa, Salomé e Duda. A situação piora quando Antunes decide conquistar a filha de sua esposa.

O romance conturbado entre Salomé piora quando ele se envolve com Carmen (Andréia Veiga), uma moça simples que sonha em ser cantora de rádio, mas que é namoradeira e mal falada. A jovem é irmã de Guto (Jandir Ferrari), um atleta que pensa em se tornar jogador de futebol. Guto e apaixona por Berta, que também é a paixão de Ruggero, criando assim mais um triângulo amoroso.

Apesar de Carmen ser apaixonada por Duda, a grande ameaça ao romance dele com Salomé é Santa, que faz de tudo para separar o casal. Para acabar com a relação da filha, a megera pede que Antunes, já totalmente apaixonado pela protagonista, mate Duda por ter desonrado Salomé.

O fazendeiro segue a idéia da megera e arma uma cilada para Duda, que consegue fugir. Entre culpa, remorso e ameaças, Santa teme ser desmascarada e resolve matar Antunes, para que ele não revele que a idéia de matar o amado da filha foi dela. Entre idas e vindas, Salomé se acerta com o Duda, que se torna um cantor de sucesso. Os dois decidem reconstruir suas vidas na fazenda Pindorama. Santa por sua vez acaba louca, da mesma forma que julgava Ernestina.

Salomé foi à segunda tentativa de exibir uma novela totalmente gravada, a primeira foi Pacto de Sangue, exibida em 1989.  O autor Sérgio Marques, que escrevia sua primeira novela como titular, desenvolveu a trama baseada na obra de Menotti Del Picchia, que por sua vez foi inspirada na história bíblica.  O autor Oscar Wilde escreveu uma peça homônima em 1893 inspirada na personagem bíblica, que possui uma enorme crueldade. Na peça, Salomé era cruel por causa do amor, um amor rejeitado. O autor transformou a novela em um mix de teatro e literatura.

A eferverscência cultural de São Paulo dos anos de 1930 foi abordada na trama através de Duda e Carmen, retratando a era de ouro do rádio.  Salomé deveria ter sido desenvolvida por Gilberto Braga em 1978, mas o autor foi promovido para as 20h, onde escreveu Dancin’Days.  A trama ficou esquecida até o fim dos anos de 1980. A idéia era que a trama tivesse apenas 60 capítulos, mas Boni insistiu que ela tivesse o dobro. No final foram 107 capítulos.

A equipe de cenografia reconstituiu perfeitamente a Paris de 1930, além da São Paulo do início do século XX. Uma cidade cenográfica de 3.500m².  Foi construída em Barra de Guaratiba, no Rio de Janeiro. A cenografia utilizou uma técnica para envelhecer construções, o que deu um ar mais realístico da época.

Salomé teve suas cenas internas gravadas nos estúdios da Cinédia, no bairro de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. A equipe de cenografia projetou 30 cenários diferentes, o que dava ao diretor a possibilidade de usar mais de 150 ambientes diferentes.  Algumas cenas foram gravadas em Páris, em mansões em Petrópolis e em Valença, que é onde fica a Fazenda Vista Alegre, que na trama era a fazenda Pindorama. A equipe de produção pesquisou detalhadamente a época e reconstitui tudo fielmente.

As cenas iniciais, onde Salomé dançava a dança dos sete véus causou polêmica, mas nenhuma nudez foi mostrada.  Destaque pela coragem em mostrar uma personagem seminua às 18h, no início dos anos 90. Hoje seria impossível diante da classificação indicativa. O figurino da protagonista tinha mais de 70 peças, entre elas peças intimas.

Salomé tinha a premissa de substituir o grande sucesso Barriga de Aluguel, mas a trama inovadora foi vista como confusa pelo público e a audiência caiu. A novela teve 35 pontos de audiência, considerada um fracasso para os padrões da época, já que anterior havia dado 60 pontos. Depois da trama, a TV Globo só voltaria a produzir uma novela de época no horário das 18h em 1999. A novela em questão foi Força de um Desejo.

A abertura criada por Hans Donner foi uma montagem das obra O Beijo (de 1907) pintor austríaco Gustavo Klimt. Era mostrado um casal em momentos românticos e a cada movimento eram inserida imagens de mosaicos no estilo art déco. A reprodução da obra do pintor ficou a cargo de Gustavo Garnier, enquanto a fonte do logo foi criada por Silvia Trenker.

Segundo o próprio Hans foi uma das melhores aberturas feitas por ele. A trama teve as habituais trilhas sonoras: nacional e internacional. O álbum nacional era estampado por Petrônio Gontijo e continha as faixas:  Sombra em Nosso Olhar (Smoke Gets in Your Eyes)/Selma Reis, Fim de Jogo/Elba Ramalho, Te Amo / Biafra, Nunca Pensei / Elymar Santos, O que é que eu Faço /Joanna,Faz de Conta (Make Believe) / Edson Cordeiro, Nazareno / A Caverna,Olhos de Jade / Beto Guedes, Riscos do Amor / Rosana, Destino /Patrícia Marques, Recomeçar / Daniel Rossano, Tá Faltando Ela /Francis Bringel, Jura/ Ta-Hi (Prá Você Gostar de mim)/ Agora é Cinza /Duda e Carmen e Capivara/A Caverna. Curiosamente, Petrônio Gontijo e Andréia Veiga cantaram uma musica do álbum. Segundo boatos da época, o tema de abertura era para ser cantado por Mara Maravilha, que apresentava um programa infantil no SBT. Por causa contratual, a emissora pediu que Selma Reis gravasse o tema. O álbum da apresentadora infantil Curumim de 1991 contêm a musica.

A trilha internacional era estampado pela atriz Flávia Monteiro e continha as músicas: With a Song in my Heart/ Doris Day, I’m Confessin/ Perry Como, Tea for Two/ Sarah Johnson,
I’m in the Mood for Love/ Johnny Mathis, Adios/ Ray Anthony, This Night was Made for Dancing/ Roger Whiteman, I Only Have Eyes for You/ Sweet Memories, As Time Goes By /Andy Williams, Cuando Vuelva a Tu Lado/ Eydie Gormé y Trio Los Panchos, Ebb Tide/ Righteous Brothers, Stormy Weather/ Lena Horne, I Tuoi Occhi Belli/ Gianni Turillo, Fascination/ The Chicago Singers e La Mer/ Dalida.

Entre os destaques da trama estão a atriz Imara Reis, irrepreensível em seu papel, Carlos Alberto, Lilia Cabral e Suzy Rêgo. Mas quem roubou a cena mesmo foi Patrícia Pillar, totalmente loira para compor o personagem. A atriz conseguiu unir beleza, sensualidade e dramaticidade em uma personagem em um momento raro, poucas vezes visto em nossa TV. A atriz ganhou o papel depois de eu bom desempenho em Rainha da Sucata. O diretor Herval Rossano fez uma participação como o pai de Duda.

O livro de Menotti Del Picchia que não era editado desde 1975 voltou a ser um dos mais vendidos durante a exibição da trama. Salomé foi vendida para inúmeros países, mas não como novela e sim como macrossérie. As novelas Pacto de Sangue e Vida Nova, de Benedito Ruy Barbosa também foram vendidas como tal.

Escrita por Sérgio Marques com a colaboração de Marcia Prates e Elizabeth Jhin, Salomé foi dirigida por Herval Rossano e Marco Aurélio Bagno, sob a supervisão de Daniel Filho. A novela foi exibida originalmente entre 03 de junho e 05 de outubro de 1991 às 18h e nunca teve uma reprise no Vale a Pena Ver de Novo.

Salomé é uma obra que foi exibida no horário e na época errada. Talvez se tivesse sido exibida como minissérie ou em outro horário talvez tivesse sido um sucesso. Independente disso, é uma trama que merece ser lembrada por sua caprichosa produção de época e pelo texto, incompreendido nos anos 90. Vale a pena esperar por sua reprise no Viva.


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